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Futebol não se separa da vida. Ele é uma manifestação cultural, presente no dia a dia de todos. Afeta economia, humor das pessoas, catalisa transformações sociais. Ele cria conceitos, e se torna exemplo. Resumir o futebol aos limites do campo é não entender o verdadeiro o tamanho que ele tem.

Os números, a ciência, a análise tática, e a experiência do campo até ajudam a explicar o jogo, mas não são capazes de enxergar até onde o futebol é capaz de ir.

O futebol e a história caminham juntos, nem sempre por terrenos tranquilos. Popular que é, ele foi – e é – usado como vínculo de identidade de nações em vários lugares do mundo. Com histórias fantásticas, e outras tristes.

Se na Itália campeã mundial de 1934 e 1938 os jogadores italianos tinham que saudar o fascista Mussolini, a nazista Alemanha não tolerou a “vergonha” da sua seleção ser derrotada por um time ucraniano. Os jogadores do Dínamo de Kiev foram avisados de que morreriam se vencessem a partida que aconteceu em 1942, durante a ocupação na Segunda Guerra. Honraram chuteiras, a dignidade e a pátria, venceram a partida e morreram fuzilados com a camisa do t com a camisa do time Um monumento na Ucrânia conta essa essa história.

O poder soviético também trouxe vítimas para o esporte. Kubala, Puskas, Kocsis jogaram por times do exílio húngaro e foram punidos pela poderosa FIFA.

Na Guerra da Independência contra contra a França, a Argélia montou uma seleção de futebol que vestiu a camisa do país pela primeira vez, com argelinos que ganhavam a vida jogando no país colonizador. Só Marrocos topou enfrentar um time que representava o sentimento de uma nação. A seleção marroquina foi desfiliada, e os jogadores argelinos não mais jogaram profissionalmente.

E seriam muitos os outros exemplos do futebol atuando em movimentos sociais importantes, mas precisamos chegar na Espanha.

O ditador Ferdinando Franco – de 1938 a 1973 – também usava o futebol para faturar politicamente. O poderoso Real Madri, que reinou no mundo entre 1956 e 1960, era um cartão de visita da ditadura. O Barcelona era a resistência. O presidente do clube morreu pelas balas franquistas. O time catalão se tronou peregrino, assim como Eusaki. Os dois eram símbolos da resistência democrática para o mundo. E isso traz reflexos até hoje, quando o El Clássico foi suspenso em função de protestos em toda Catalunha ainda em 2019.

E seriam muitos os outros exemplos do futebol atuando em movimentos sociais importantes, como o que vivemos hoje. Uma onda solidária aproxima ídolos e fãs, distribui dinheiro e auxilia no combate a uma pandemia inimaginável.

E, mais, entender e esclarecer as pessoas sobre a gravidade da situação, a necessidade do isolamento, da prevenção, combatendo de maneira ativa posturas que contribuem para agravar uma situação que já é muito grave, também é algo fundamental nessa hora. E personagens do esporte entenderam esse compromisso que tem com o próximo.

Hoje, o esporte vive uma luta contra um vírus. E quando vencermos essa briga, ele precisa continuar ativo no combate a outros problemas sérios, como o preconceito.

Combater o racismo, a misoginia, a homofobia também precisa ser uma causa do movimento esportivo. E a participação de todos é importante.

No mundo, muitos são os exemplos de atletas que entenderam que sua força vai muito além de uma pista ou quadra ou campo, e que eles podem ser agentes importantes na construção de uma sociedade melhor, menos excludente e mais humana. E o primeiro passo para atacar o problema é se posicionar.

Nelson Rodrigues já escreveu: “No futebol, a pior cegueira é só enxergar a bola”.